terça-feira, 24 de maio de 2011

O passeio ao Rio.

Estou eu no Rio, vim com meu irmão Lourenço, e fomos visitar Niterói.
Saimos do Rio ao anoitecer, o mar estava calmo e na barca em que fomos, havia uns garotos cantando e se acompanhando com seus instrumentos.
O luar estava lindo ! Sua luz refletia nas águas e pareciam peixinhos, prateados, que dançavam no mar.
Era para eu achar tudo  encantador, mas confesso que sou muito medrosa e só porque ouvia uma espécie de assovio na barca, todo meu prazer se transformou em medo da mesma virar.
Desembarcamos e tomamos um bonde para ir até uma confeitaria tomar qualquer coisa.
Eu achei tudo muito alegre : o salão muito claro, as meses muito bonitas, com lindas jarras de flores e muitos rapazes tomando sorvete. Uma boa orquestra animava aquele ambiente já tão alegre.
Eu estava de costas para uns rapazes, tomava bem calma meu cafezinho com biscoitos, quando, de repente, sinto um susto e vejo pular em nossa mesa uma bolinha de miolo de pão. Olho para os rapazes, meu irmão percebe que houve qualquer coisa e pergunta :
- Que foi ?
Eu, sabendo que ele é muito nervoso e temendo uma reação de sua parte ( apesar deu ter achado graça na brincadeira) digo :
- Nada !
Ele, desconfiado, fechou a cara e achou melhor irmos embora.
Logo voltamos para Belo Horizonte, pois Lourenço já havia resolvido o que o levou até lá, e eu precisava ficar com Titia.

domingo, 8 de maio de 2011

Aniversário

Dia 06/01/1921 - Quinta feira : Completo hoje 18 anos e passei um dia muito alegre e feliz !
Logo pela manhã, fui com tio Roberto, à estação, esperar duas de minhas irmãs, a Maria e a Toquinho, que vieram do Rio.
Antes da chegada do trem, o Tio Roberto, que sempre gostou de me contrariar, disse :
- Eu aposto, Santa, que elas não vêm hoje, dou-lhe até um presente, caso eu perca a aposta.
Eu, não querendo mostrar que ficara zangada, respondi :
- Não, tio Roberto, vamos apostar, mas é assim, se o senhor perder, me dará um vidro de extrato de Maderas do Oriente e se eu perder, lhe darei uma caneta tinteiro.
Esperando mais alguns minutos, ouvimos o apito da locomotiva, meu coração começou a bater mais forte que um relógio.
Afinal, os carros param e vejo a Toquinho na janela. Ou seja, neste dia, tio Roberto teve que me dar dois presentes : o Maderas e o de aniversário, que foi um estojo de costura.
Durante a tarde, todas nós, fizemos marcas de cotillon*, para o baile da noite.
A Neide, minha irmã mais velha, tem um genio muito bom e alegre, é ela quem inventa fazer estas marcas e dirige tudo.
Fazemos depois a lista de convidados, tendo sempre em primeiro lugar o Newton. Cada uma das primas lembra o nome de um rapaz preferido. Entre essas marcas de cotillon, todas muito interessantes, há uma de que todas gostam : cola-se uma fita de papel de seda azul a outra vermelha; uma verde e a outra branca e assim por diante, sempre desencontrando as cores, uma pessoa segura nas fitas, no lugar da emenda, cada rapaz de um lado, pega na ponta de uma das fitas e cada moça, de outro lado, segura também na extremidade de uma delas. A pessoa que segura no meio, solta. Moças e rapazes puxam as fitas, pensando que a azul vai dançar com azul e a branca com branca, mas sai tudo diferente.
Dançamos hoje até ás duas da madrugada e eu me deitei ás duas e meia, muito feliz com as visitas e cumprimentos que recebi e satisfeita com os presentes que ganhei.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

O diário - Janeiro de 1921

Dia 1º, sábado : Desde que deixei  o Colégio, onde fui educada, tenho o hábito de me confessar e comungar, quase todos os sábados, em honra à Imaculada Conceição, de quem sou muito devota, além de ser filha de Maria, mas hoje me levantei muito tarde, às 10 horas, não fui à missa, nem comunguei.
Os dias têm estado muito chuvosos, desde o dia 30 de dezembro do ano passado, tem caído uma chuvinha fria e impertinente.
O sábado é o dia dedicado a minha correspondência e hoje escrevi a Paulina, a Beatriz e a Neusa Gonçalves, todas três foram minhas colegas de Colégio.
 As duas primeiras são sobrinhas de um ex presidente mineiro e a terceira, a quem de dedico sincera e profunda amizade, é filha de um advogado de Itabira.
Boas festas desejo aos que por simplicidade lêem estas linhas.
Hoje, meus primos Newton e Ernesto estiveram aqui em visita ao vovô, o primeiro é um rapaz do interior de Minas, estudante de medicina, muito esforçado e... muito simpático.

Dia 2, domingo : Levantei-me hoje às sete e meia e fui à missa na Igreja da Boa Viagem. Dizem que esta igreja é ainda dos tempos do Curral Del Rey. Eu gosto de rezar lá porque aprecio imensamente estas tradições antigas.
A chuva continua caindo e assim o domingo não deixou de ser insípido. Como não gosto muito de sair, passei quase o dia todo em casa, copiando músicas para uma religiosa do Colégio onde fui educada. Tenho grande estima e consideração por essa irmã e gosto muito de trabalhar para ela.
Todas as noites, vêm muitas pessoas aqui na casa de vovô, parentes e amigos. Ficamos conversando até bem tarde e hoje quando fui dormir já eram onze e meia da noite.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Da autora

Antes de principiar a descrição deste meu diário, quero apresentar-lhes a família com quem moro, e ela é composta de três pessoas : meu avô, já bem idoso, tia Luizinha, que sempre quis conservar-se solteira, para fazer companhia para meu avô e afinal, meu tio Roberto, também solteiro e caçula da família, mas um caçulão, pois já tem, parece, mais de 30 anos !
Além destas três pessoas, residem com vovô, dois primos meus, estudantes e uma priminha que é o encanto do lar, orfã de mãe e que é criada pela titia.
E enfim, a autora deste diário : Santa, como sou conhecida na intimidade.
Apresentada a família com quem moro, vou agora apresentar-lhes a mim mesma, fazendo o meu perfil.
Estatura mediana, cabelos pretos, penteados com simplicidade, testa ampla, olhos verdes ( e dizem que são tristes ) tez morena, faces rosadas ( quando ponho rouge ) o que acontece raras vezes e faz um de meus primos dizer que quando eu pinto ''o rosto naturalmente'', fico diferente das outras,em uma vaidade natural e mui feminina, eu sorri, pensando : '' Com certeza ele me disse diferente, para não dizer mais bonita."
Aliás, conheci seu pensamento pelo sorriso de seu olhar.
Mas não vão de todo pensar que acreditei em meu pensamento, pois lhes digo e com a mais sincera franqueza : sempre que me olhava no espelho, dizia a mim mesma :
- Oh feiura ! Como pode ser uma criatura tão feia assim ?!
Prosseguindo em meu perfil : rosto oval, boca regular, lábios fino, dentes certos e claros, nariz ( agora é a hora do nariz ! Não vou dizer que sou nariguda ) como querem alguns, só porque em uma fotografia que tirei no Colégio, meu nariz saiu grande, dizem isto, mas ele é bem proporcionado.Quando choro, ele fica vermelho e parece que aumenta, com certeza é por isso que meus irmãos, para implicarem comigo, dizem :
- Santa, nariz grande !
Apesar mesmo de eu ter o cuidado de ficar no quarto fechada, sempre que choro e só sair depois que o rosto está descongestionado e cheio de pó de arroz.
Continuando a leitura deste diário, verão enfim o que conto a respeito de um cavalheiro que me disse :
- Perfil Grego
e eu lhe respondi :
- Antipatia !
E sua réplica :
- Bonito.
Mas, bem dentro de meu íntimo, eu me senti orgulhosa e consolada, pois até aquela data, quando pensava em meu nariz, sentia um baque no coração e uma tristeza...
Concluam daí o que seja este meu nariz, que tanto deu o que escrever à seu respeito.
Meço 1,69cm e peso, quando os incômodos do espírito me permitem, 52 quilos, para depois cair em 47.
Visto-me sempre com simplicidade, preferindo as cores lilás e azul.

Termina aqui a apresentação e começo a escrever meu diário.

Maria Mata Machado, 1921.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Era uma vez, de verdade.

Pedro da Matta

Carlota Pereira
Maria Regina da Matta Machado de Castro, filha de Pedro da Mata Machado e Carlota Pereira da Silva, nasceu em 1903, na cidade de Diamantina - MG.
Se casou, teve 4 filhos, um deles, minha avó, Ione de Castro Moraes.
Ou seja, venho contar à vocês a história de minha bisavó, ou melhor, deixarei que ela mesmo conte.
Não, não faremos aqui, nenhuma sessão de espiritismo para que isso seja possível do céu.
Durante sua vida, bivó Maria, como meus primos mais velhos a chamavam, pois eu, sendo a caçula da caçula de suas netas, não tive o prazer de conhece-la , não pessoalmente, pois como ia dizendo, bivó deixou alguns diários, que mostram de quem herdei o gosto pela escrita, não só pela escrita, mas também pela música clássica e pelo ballet.
A partir deste post, transcrevo aqui, os diários dela, que pertencem à minha mãe e quem sabe até consigo emprestado aqueles que estão com outras partes da família.
De seus filhos vivos, estão meu tio Hélcio e meu vô de coração, Geraldo , irmão de minha vó, que sempre nos tratou ( a mim e meus primos ) como netos e foi muitas vezes como um pai para os sobrinhos.
Acho tão bonita essa coisa de passado, me fascino tanto pela vida antiga e pela formação de uma família. Qualquer rumo que um deles tivesse tomado, talvez eu não estivesse aqui hoje.
Bom, espero que alguém faça essa viagem no tempo comigo.

Um beijo.
Adriana.